OS MOSCAVIADAS
OS MOSCAVÍADAS
AS DAMAS E OS VARÕES ASSINALADOS
QUE EM MOSCAVIDE EM TEMPOS HABITARAM
E QUE POR OUTRAS TERRAS ESPALHADOS
SÓ ESTA NA MEMÓRIA CONSERVARAM
NÃO OLVIDANDO NUNCA OS BONS BOCADOS
QUE EM REMOTOS TEMPOS LÁ PASSARAM,
CANTADO ESPALHAREI POR TODA A PARTE
SE A TANTO ME AJUDAR O ENGENHO E A ARTE
E CANTANDO EU GARANTO A TODA A GENTE
QUE OS CARECAS QUE VEJO À MINHA FRENTE
OS CONHECI COM FARTAS CABELEIRAS,
COM MUITA BRILHANTINA E COM PENEIRAS
DE QUEM TINHA O FUTURO PELA FRENTE
E CANTO AS MIL E UMA BRINCADEIRAS
A QUE A MALTA CÁ DO SÍTIO SE ENTREGAVA
QUANDO O PRESENTE APENAS IMPORTAVA
E CANTO O BEM E O MAL, NÃO ESCONDO NADA:
O EIXO E A “PRIMEIRA CAGANEIRA”,
AS PÚRRIAS E AS GUERRAS À PEDRADA
DE PONTARIA ÀS VEZES TRAIÇOEIRA
E AS HOMÉRICAS CENAS DE PORRADA
QUE QUEBRAVAM DO BURGO A PASMACEIRA,
AS QUAIS DECORRIAM SOBRETUDO
À SOMBRA DAS ÁRVORES DO “TALUDO”
AS PÚRRIAS E AS GUERRAS À PEDRADA
DE PONTARIA ÀS VEZES TRAIÇOEIRA
E AS HOMÉRICAS CENAS DE PORRADA
QUE QUEBRAVAM DO BURGO A PASMACEIRA,
AS QUAIS DECORRIAM SOBRETUDO
À SOMBRA DAS ÁRVORES DO “TALUDO”
DAQUI PARTIRAM MUITOS DOS GUERREIROS
P’RÁ BATALHA DA VIDA, MUNDO FORA
E A LEMBRANÇA DOS TEMPOS PIONEIROS
EM SEUS NOBRES PEITOS ‘INDA MORA
E EI-LOS DE NOVO AGORA NO TERREIRO
P’RA RECORDAR OS FEITOS DE OUTRORA
MAS RECORDAR APENAS, POIS, COITADOS,
P'RA MAIS LHES FALTA O FÔLEGO...TÃO CANSADOS
AS MIÚDAS DESSE TEMPO TENHO EM MENTE
E O MEU CANTO TAMBÉM VAI PARA ELAS.
NÓS A BRINCAR NA RUA LIVREMENTE
E AS POBRES A ESPREITAR PELAS JANELAS!
JÁ FARTA DOS TRICOTS E DOS BORDADOS
POR CERTO MUITA MENINA RECATADA
SONHOU VIR PARA A RUA, E SEM CUIDADOS,
ANDAR TAMBÉM COM A MALTA “À BATATADA”
MIÚDAS DO MEU TEMPO, AQUI VOS DEIXO
MEU CANTO DE LAMENTO INCONFORMADO
POR NUNCA VOS TERMOS CONVIDADO
P’RA CONNOSCO JOGAR, UM DIA, AO EIXO,
AO BILES, À BOLA, AO REI-MANDADO,
TENDO DEIXADO SÓ EM VOSSA MÃO,
COMO EXCLUSIVA E CHATA DIVERSÃO
O PONTO DE PÉ-FLOR E O CHULEADO
E CANTO AS MATINÉS GLORIOSAS
DO NOSSO SAUDOSO "FAMILIAR"
E AS JOVENS ESBELTAS E FORMOSAS
COM QUEM ERA UM PRAZER ENTÃO DANÇAR!
DE NÃO SE “LEVAR TAMPA” HAVIA A ESPERANÇA
MAS NADA SE PERDIA EM ARRISCAR
UM SINAL CÁ DE LONGE, “A MENINA DANÇA”’
E DIZENDO ELA “SIM” ERA AVANÇAR
E ERA VÊ-LOS ENTÃO RODOPIAR
AO SOM DOS BLUES, VALSAS, TANGANHADAS,
AS VIGILANTES MÃES A SUSPIRAR
NÃO FOSSEM SUAS FILHAS, TÃO PRENDADAS
CAÍR NA TENTAÇÃO DAS MARMELADAS
NO ENVOLVENTE ABRAÇO DO SEU PAR...
DAS MÃES SÓ SE ACABAVA O SOFRIMENTO
COM A MÁGICA PALAVRA “CASAMENTO”
AQUILO, SIM SENHOR, ERA DANÇAR!
COM RITMO, COM ARTE, COM GANÂNCIA!
OS PARES AGARRADINHOS A RODAR,
ELE DE LENÇO NA MÃO P’RA PRESERVAR
DOS VESTIDOS DELA A ELEGÂNCIA.
HOJE, MAIS NÃO SE FAZ DO QUE PULAR
E CHAMAR DANÇA, PENSO, É UM TOPETE,
A UM SIMPLES “ABANAR O CAPACETE”
O SÉCULO EM QUE NASCEMOS ACABOU
DIZEM UNS QUE FOI BOM, OUTROS QUE NÃO
MAS TANTA COISA DELE EM NÓS FICOU
QUE NOS ENCHE DE ORGULHO O CORAÇÃO
E AO LONGO DOS SEUS ANOS ELE MARCOU
OS “BORRACHOS” DA NOSSA GERAÇÃO!
QUE O PASSADO, PORÉM, NÃO NOS IMPEÇA
DE HONRAR O NOVO SÉCULO QUE COMEÇA
Ó PODEROSOS DEUSES IMORTAIS,
NESTE FELIZ ENCONTRO DE AMIGOS
QUE OUTRA COISA EU POSSO PEDIR MAIS
P’RA RELEMBRAR OS BONS TEMPOS ANTIGOS
(AQUILO É QUE ERAM TEMPOS DO CARAÇAS!)
SENÃO A CONCESSÃO DAS VOSSA GRAÇAS
PARA OS PODER CANTAR COM ALMA E BRIO
ATÉ QUE A VOZ ME FALTE E EU PERCA O PIO.
PIU!
Moscavide, 8 de Abril de 2000
Num dos almoços dos "borrachos dos anos cinquenta,
no restaurante do estádio do Olivais e Moscavide
15 Comments:
Sempre o teu sentido de humor nesses convívios...
... e o rapapé às moçoilas...
Um beijinho, António
Está muito bonito. Mais uma vez. Tocou-me. Entendi que não escapei muito a "essas moças prendadas que ficavam à janela e desejavam ir à rua para andar há batatada". Apesar de pertencer a uma geração diferente, ainda levei com résqueas das anteriores. As coisas passam-se assim. Vão descamando. Algumas ficam, outras desaparecem. Continua a cantar, e a piar, porque gosto bastante de te ouvir!
Cristina
oOlá António, cada vez mais acutilante.Parabéns, como sempre fico rendida a essa forma quase única de se expressar. de falar a brincar de coisas tão do nosso agrado que nos levam numa viagem a um passado recente..Parabéns mesmo António..Quero poder continuar a ler estes escritos.um abraço..ell
Deixas-me a rir outra vez!
"POR NUNCA VOS TERMOS CONVIDADO
P’RA CONNOSCO JOGAR, UM DIA, AO EIXO,
AO BILES, À BOLA, AO REI-MANDADO,"
Ainda vamos a tempo! Beijos em ti, genial António
que nunca o pio te falte!...
carradas de talento! para além prazer de ler-(te) saúdo em ti terna ironia com que "revives" o passado.
uma lição de vida. abraços
Excelente!! Adorei, António. Nesse tempo era mesmo assim, eu sei, tenho cá o meu pai que tanta história me conta. Um prazer ler-te. Beijinhos.
De se lhe tirar o chapéu, António!
Eu, já num tempo bem distante desse, também fugia aos bordados e crochés pra jogar à bola e à bilharda! Mas só até a minha mãe dar conta...
Quanto às danças... nada me tira da ideia que ainda estou solteira porque agora só se abana o capacete!
Beijinhos
Un fraternal saludo "borracho" y "careca".
Foi com muita emoção que li mais uma das tuas belas histórias a recordar " os bons tempos antigos"!
Mais uma vez pressiono- te a publicares o que escreves!
Beijos meu querido amigo,
Maria
Oh amigo António do meu coração, cá estás tu qual Camões " ou ainda melhor" escrevendo odes à tua juventude.
Verdadeiramente épico, cheio de graça e ironia como só tu sabes fazer.
És um mestre nisto meu amigo.
Digo-te com toda a sinceridade que até me dá vontade de ir a um desses almoços dos borrachos dos anos cinquenta.
Tenho a certeza que me ia divertir á grande! Eu que adoro copos, petiscos e festarola.
Gostei da tua atenção em lembrar as prendadas meninas fazendo bordados à janela, outros tempos!
Coitadas dizemos nós, mas não sei quem é mais coitada, se elas que tinham a noção que a sociedade da época não lhes permitia serem iguais, se nós que achamos que somos e no entanto somos diariamente confrontadas, nos empregos, na rua, na nossa vida quotidiana com a realidade crua e dura mostrando que na verdade o machismo ainda dá cartas e ainda estamos muito longe dessa dita igualdade.
Vamos lá honrar o novo século e ver se continuamos a longa caminhada que há muito tempo iniciamos.
Não queremos ser todos iguais, nem pensar até porque de facto somos todos diferentes. Queremos sim que haja igual respeito pelas nossas diferenças, isso sim.
Desculpa meu amigo, já estava a divagar, como é meu costume.
Já sabes como sou, as palavras crescem-me na ponta dos dedos, não consigo evitar!
Um abraço muito amigo
Isabel
Como é bom vir até aqui meu amigo
Sempre um prazer ler , sorrir e sentir as suas palavras
Deixo um beijo sorridente com o desejo de um lindo fim de semana
(*)
Olá António, passo, leio de novo e parto, não sem antes deixar um abraço.. Não sei nada de si.. espero que tudo esteja bem...
abraço, meu Caro António
Caro António,
Nestes versos mais que perfeitos dás-nos a conhecer num ápice o quadro sinóptico de uma época, com uma fortíssima análise em que a forma/conteúdo nos aparece num crescendo nível fónico e nos surpreende no desenrolar de oitavas paras oitavas.
Relativamente à componente semântica estão bem visíveis as acutilantes Figuras de pensamento; a Ironia;a Hipérbole e até a Imagem em que a visão é mais ampla que a comparação e/ou a metáfora.
Igualmente patente é o Discurso Figurado com referência ao comportamento dos costumes. É notória a grande musicalidade, fluidez e equilíbrio entre a forma do pensamento e o jogo de palavras.
Sobretudo é de realçar que todos os elementos que contribuem para esta composição se assemelham na forma aos cantos épicos e líricos de Camões.
As minhas felicitações com um grande abraço.
Poça, Amigo Pepe, aprimoraste-te no comentário!
Não sei se o meu poema lhe chega aos calcanhares.
Quanto à tua análise literária, estás aprovado com 20 valores.
um abraço
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