8.05.2007

E agora HUMOR.... porque não?

SOPA NA CAFETEIRA ?!!!


O visado nestes versos era meu chefe de Secção

na CP. Muito sovina, mais do que modestamente

vestido, apesar de proprietário e com posses,

o seu almoço, no escritório, resumia-se invariavelmente

a uma sanduíche e um pouco de sopa que transportava

e aquecia numa cafeteira e dela comia directamente,

com um rangido arrepiante da colher

a raspar pelo alumínio da extravagante marmita.

Habitando no 2º piso de um prédio de que era proprietário,

não possuía luz eléctrica porque, dizia,

lhe bastava a claridade do anúncio publicitário luminoso

de um cinema que funcionava no rés do chão do mesmo edifício.


Na alcofa comem os cavalos,

Na pia os porcos cevados,

As galinhas comem no chão ...

Mais finos e delicados

Os homens comem em pratos,

Que é sinal de distinção.


Agora não há maneira

De saber qual a razão

Porque põe certo animal

A tromba na cafeteira

Para comer a ração !...


Comer a sopa em panelas,

Em tachos ou em gamelas,

Não é bonito, mas vá ..

Mas agora em cafeteira

Essa é que é de primeira !

O homem estará gá-gá ?


Por isso ele anda tão magro,

Lazarento e escanzelado.

Mais lhe valera um penico !

Pois só um animal de bico,

Onde a sopa não abunda,

Pode pescar qualquer coisa

Numa gamela tão funda


Quando na pesca do caldo

Ouço o arranhar da colher,

Quedo-me mudo, a pensar

Se teve o bom Molière

Mérito algum ao criar

O seu famoso “Avarento”

É que ao ver este jumento

Em tal tarefa empenhado

Chego sempre à conclusão

De que nada é inventado

E que afinal a ficção

Mora mesmo a nosso lado

_____________________

1963


14 Comments:

Blogger Márcio Beckman said...

Olá António! Valeu pela visita lá no meu blog! Gostei da poesia com um toque de humor, porque cultivar o bom humor faz bem pra você e para o mundo. Bem ao contrário de como era o seu chefe... Parece que algumas pessoas não sei bem o porque se limitam a ter uma vida de animal, preocupados apenas em comer, dormir e reproduzir-se... É preciso dar um passo a mais para ser humano. Obrigado pelos elogios às minhas histórias. Faz algum tempo que eu escrevo poesia, mas quanto a escrever contos é um trabalho que eu estou começando a me dedicar um pouco mais agora, então de certa forma é uma experiência nova para mim. Bom, vou continuar acompanhando os seus textos aqui no Escritos Outonais. Então, até qualquer hora!

05 agosto, 2007 23:58  
Blogger Paula Raposo said...

Excelente António! Adorei o teu sentido de humor. Muitos beijos meus.

05 agosto, 2007 23:59  
Blogger Odele Souza said...

Fiquei imaginando a cena e foi impossível conter o riso, o mérito claro, é seu, pela forma como descreveu a situação.

Comer sopa em cafeiteira, hein Antonio? Nunca vi. Que feio e deselegante. Que avarento!

Fique com meu carinho e meu desejo de boa semana.

06 agosto, 2007 02:26  
Blogger Eme said...

O homem era forreta? Sopa pela cafeteira para não a partilhar com nínguém.. hehe, estou mesmo a imaginar a cena.. :)
Beijinhos

06 agosto, 2007 19:18  
Blogger Bichodeconta said...

Ó António, obrigada porque me fez rir a bom rir e isso é muito bom.. Eu estava a ver a cena.. Contava o meu pai, uma ´rábula em que uma raposa que queria comer uma cegonha a convidou para sua casa e lhe serviu umas papas de farinha de trigo num prato raso... Evitado será dizer que a raposa comeu tudo porque a cegonha com o seu bico não conseguia comer nada.. Então convidou a raposa para uma refeição de papas de farinha de trigo que serviu á raposa numa amentolia"não sei se se escreve assim" e a raposa que não conseguia enfiar na dita o fucinho, não comeu claro.. Mas seu colega bastava-lhe a cafeteira.. Essa é a pobreza que me assusta.. A pobreza do espirito... Parabéns António e um abraço grande.. FOI BOM ENCONTRÁ-LO AQUI...

06 agosto, 2007 21:23  
Anonymous Anónimo said...

Agora fez-me sorrir com esta sua veia humorística António. E nada melhor como servir em bandeja de luxo estes versos risonhos a certos sovinas, e outros parecidos, tão deliciosa e bem humorada ementa! Excelente! Abraços.

08 agosto, 2007 07:01  
Blogger Bichodeconta said...

Passo e paro para deixar um abraço...

08 agosto, 2007 08:21  
Blogger Matvi. said...

Simplesmente genial.

08 agosto, 2007 18:27  
Blogger Maria said...

Delicioso, mais uma vez.
E fizeste bem em lembrar a mentalidade de certa gentinha no "tempo da outra senhora"... miseráveis de espírito...
O teu humor bem apurada, como convinha na época...

Beijinhos

09 agosto, 2007 02:45  
Blogger LurdesMartins said...

Sorri, António! E até consegui visualizar esse senhor a almoçar... ruidosamente!
Beijinhos

09 agosto, 2007 16:51  
Blogger Pepe Luigi said...

Meu caro Melenas,

Gabo e invejo o teu sentido de oportunidade na escrita, nomeadamente em verso.
Não és um grande poeta. És sim um grandioso Vate de Alma e Coração.

Parabéns pelo teu maravilhoso trabalho!

Um abraço
Pepe.

09 agosto, 2007 21:42  
Blogger Licínia Quitério said...

Os teus versos acertam em cheio no visado. Muito vicentino, meu Amigo.

Um grande abraço.

10 agosto, 2007 18:35  
Blogger *Um Momento* said...

Imaginando-me a comer a sopa uma cafeteira:D
Adorei o seu sentido de humor
Votos de um lindo fim de semana
Beijinho

(*)

11 agosto, 2007 01:41  
Blogger Menina Marota said...

Belo sentido de humor que colocou um grande sorriso no meu rosto...

Consigo imaginar o som da colher no alumínio... :-)))

Beijinho e que estejas bem ;)

16 agosto, 2007 16:06  

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