ENTRE DOIS AMORES
Em 11-1- 1952 escrevi um soneto a que dei o título de “Porquê?” Mas logo me arrependi, e ainda antes do dia acabar, já tinha feito outro em sua substituição, a que chamei “O Dia há-de vir” e fui a correr pedir à destinatária para me devolver o primeiro porque o segundo é que valia. Claro que ela guardou os dois.
No primeiro, o Poeta, cansado e triste, pede para dormir e esquecer no colo da Amada toda a angústia que lhe provoca a infindável noite que os envolve:
No segundo, opta por irem ambos fazer algo de concreto, para que o Dia chegue.
Naquele tempo era um dilema frequente para muitos jovens da nossa terra (os que pensavam, claro, apenas os que pensavam) acomodarem-se ou fazerem algo para que as coisas mudassem. E não era fácil trocar o colo da Amada pela incomodidade da Luta. Mas, de entre esses , muitos houve que preferiram a opção menos fácil e alguns, mesmo, de uma forma total e absoluta.
E se fosse hoje? qual das duas versões do poema eu escolheria? Hoje, a pergunta é, porventura ociosa, pois já me falta o jeito quer para uma quer para outra das opções. Ou não?
PORQUÊ ?
Porquê tão escura a noite sem estrelas
Tão triste o uivar do vento, meu Amor?...
Porquê tanta miséria e tanta dor
Nos casebres imundos das vielas?...
Porquê de fome faces amarelas,
Tanto ódio infernal, tanto rancor,
Tanta injustiça, tanta? ... Que pavor
A escuridão da noite sem estrelas!...
Sinto-me tão triste e tão cansado!...
Ah! Se esta noite negra de pecado
Mudasse em radioso amanhecer...
Enquanto se não cumpre o meu anseio
Deixa pousar a fronte no teu seio
E deixa-me dormir...dormir... esquecer...
O DIA HÁ-DE VIR
Quão longa é esta noite, este temor
Que sobre a nossa terra se abateu!
Que crimes este povo cometeu
Para ser sujeito assim a tanta dor?
Não foi a liberdade só que se perdeu
A vida acinzentou, perdeu a cor
Perdeu até sentido o próprio amor
E a própria luz do sol esmoreceu
Sinto-me tão triste e tão cansado!...
Pudesse eu, em teu peito reclinado,
Dormir, esquecer, até o Sol raiar…
Mas não, Amor, que o tempo é de labuta
O DIA não vai vir sem ser com luta
E a luta, temos nós de a travar!
27 Comments:
Magníficos, António. Ambos. Eu também teria ficado com os dois! Muitos beijos.
Parabéns!
Lembrei-me de uma canção e diz assim:
De:Pablo Milañez/Simone/Chico Buarque
Artista: Simone e Chico Buarque
Título: Iolanda
Esta canção
Não é mais que uma canção
Quem dera fosse uma declaração de amor
Romântica
Sem procurar a justa forma
Do que me vem de forma assim tão caudalosa
Te amo, te amo
Eternamente te amo
Se me faltares
Nem por isso eu morro
Se é pra morrer
Quero morrer contigo
Minha solidão
Se sente acompanhada
Por isso às vezes sei que necessito
Teu colo, teu colo
Eternamente teu colo
Quando te vi
Eu bem que estava certo
De quem me sentiria descoberto
A minha pele
Vais despindo aos poucos
Me abres o peito quando me acumulas
De amores de amores
Eternamente de amores
Se alguma vez
Me sinto derrotado
Eu abro mão do sol de cada dia
Rezando o credo
Que tu me ensinaste
Olho teu rosto e digo à ventania
Iolanda, Iolanda
Eternamente Iolanda
Iolanda
Eternamente Iolanda
Eternamente Iolanda
***Acho perfeito quando fala:
"Se alguma vez/Me sinto derrotado/
Eu abro mão do sol de cada dia/Rezando o credo/Que tu me ensinaste.
Penso eu que realmente não merecemos o sol, quando somo "derrotados" por nós mesmo, por nossa omissão, nossa preguiça, nossa falta de batalha.
É isso.
Um abraço.
La lucha y la amada son merecedores de tan bellos poemas. ¿Era necesario escoger?
"Enquanto se não cumpre o meu anseio
Deixa pousar a fronte no teu seio
E deixa-me dormir...dormir... esquecer..."
tão belos e tão sentidos
acredita que ficaria com os dois
e hoje lembrei-ne da carta que escrevi e não mandei:
numa vontade de te ver
na vulgar noite vazia
onde espero sentada sem sono
vejo o papel, olhar para mim
o mesmo que tantas vezes enviei
como a pedir-me, para te escrever
num entreabrir dos meus olhos
onde escorriam lágrimas
de saudade,
deixo arrastar comigo o desejo
de sede de ti, no deambular deste silêncio
procuro cartas que outrora escrevi,
cartas onde o nosso amor
esteve sempre presente,
tal como hoje,
apesar de distantes
onde a saudade tinha sempre o nosso nome
escrevi-te de novo
para te enviar a minha mão,
entregar meus lábios
dizer-te que o nosso amor ainda perdura
e me sinto de novo especial,
nesta carta que só tu percebes
e nasceu a carta, mesmo sabendo
que pode ser imaginária…
l.maltez
deve ser do dia, está lindo e apetecia-me namorar
acho que vou mesmo namorar o mar
beijinhos para ti,
Por vezes ao ler um texto, um poema, a minha mente voa para um livro, um outro poema! Nestes e não sei porquê foi para:
“Que importa perder a vida
Em luta contra a traição
Se a Razão mesmo vencida
Não deixa de ser Razão
(A.Aleixo)
Continuo sem saber porquê, será porque ambos os dois poemas são lindos? Será pelo fim do segundo? Terá ainda a ver com o texto anterior?
Cumprimentos e
Até breve
SE DEUS QUISER
olá antonio,lindo os teus escritos, lógico que guardaria os dois, e lógico que te presenteava tambem.
pudesse-lhe eu a fronte afagar
no farto enlevo da penumbra
não na fome ou ou sede que me inunda
mas no cálido e manso despertar.
ah.. que mil velas se acendessem
e que mil noites não sobrassem
sem que as mesmas me queimassem
mas que em braços me envolvessem.
e essa fronte assim tombada
de pensamento e lassidão
debandava em turbilhão
em minha mão assim calada.
entreguei-me a ti, fulgor
de descoberta entontecida
de minha sina já esquecida
renovei-me, banhei-me, amor.
e em resposta ao 2o
bebo p´los teus lábios\ rios
incendeio de tuas mãos\ vitórias
oiço dos teus olhos\ histórias
navegando no teu mar\ navios
navios, princesas e piratas
revolvem-se nos teus cabelos
de lâ púrpura esses novelos
com que me atas e desatas
quando me atas; quase que asfixio
ata-me, enrola-me, desenrola-me
desenlaça-me, cola-me, descola-me
embrenha-me em teu mar
como se eu fora\ teu rio.
(..só presentes simples,para um homem grande)
Não se substituem. São duas faces da mesma moeda. Toda a nossa vida é feita destas interrogações: Vou? Fico? E sempre um pedaço de nós parte e o outro se detem.
P.S. Aquele meu planeta chama-se Praia de São Julião (Ericeira). Ficou assim, com uns pós de perlimpimpim...
Um beijo.
Espectaculares, os dois. Não abdicaria de nenhum bem de outro. O primeiro parece-me é mais sofrido, um pouco no estilo à Florbela Espanca. O segundo parece transmitir mais esperança, mais optimismo no andar para a frente. És espectacular António! Grande abraço!
Morgaine
www.newcitadel.blogs.sapo.pt
Caro António,
Todos nós sabemos quanto é difícil produzir poesia em sonetos.
Estes dois estão geniais.
Um abraço.
Cada qual o mais bonito! E é sempre tão difícil escolher entre dois amores... bem, podemos fazer o cara ou coroa, já que parecem duas faces da mesma moeda!
Beijinhos
António
Eu gosto dos dois poemas. Claro que ficaria com ambos.
Mas escolheria, sem dúvida nenhuma, o segundo, "O dia há-de vir", porque o tempo afinal continua a ser de... luta!!!
Quem escolhe o nosso lado como o lado certo da Vida não pode deixar de empunhar o segundo soneto...
Um beijo
Olá,
Ser feliz, do ponto de vista da psicologia, não é ter uma vida perfeita, mas saber extrair sabedoria dos erros, alegria das dores, força das decepções, coragem dos fracassos. Ser feliz neste sentido é o requisito básico para a saúde física e intelectual.
Paragrafo retirado do livro “Nunca desista dos seus sonhos” do autor augusto Cury.
É dos sonhos que eu vivo com os pés bem assentes na terra, força!
Beijinhos
Conceição Bernardino
Gostei mais do segundo porque tem mais esperança.
Não admira que ela tenha querido ficar com ambos, pois qualquer deles são excelentes. Um abraço caro Poeta.
Outro dos meus encantos? Vir até aqui e "ouvir" estes escritos outonais...
Obrigada, António.
Beijo para a tua Ana ;-)
Caro António: o eterno dilema da espécie humana (a pensante, claro): fazer ou não fazer, ser ou não ser, querer ou não querer, agir ou fingir. Dilema esse que aqui tão bem relata e retrata. Quando a falta de jeito que sugere, é modéstia do caro amigo, pois a si nem falta de vontade, nem de “jeiteira”. Mas, como muito bem diz, a nossa luta temos que ser nós a travá-la, verdade hoje um pouco esquecida nestes tempos de apatia e desinteresse, do deixa andar e não te rales. Admiro e estimo a sua real capacidade. Óptimo fim-de-semana.
«TANTO ÓDIO,TANTO RANCOR TANTA INJUSTIÇA»,...
ambos os sonetos são excelentes. entre dois amores, não meterei eu a minha colherada... rss
abraços
parabens pelo site e o layout fenomenal!!!
Ambos, trazem lá dentro "pessoas". Excelentes...portanto.
Abraço
Paulo
Boa noite,
Eu não sou de ninguém!... Quem me quiser
Há-de ser luz do Sol em tardes quentes:
Nos olhos de água clara há-de trazer
As fúlgidas pupilas dos videntes!
“ Flor bela Espanca”
Esta é a forma que eu encontro para comentar
A mais pura a que eu vos quero entregar
A minha amizade...
Conceição Bernardino
http://amanhecer-palavrasousadas.blogspot.com
Simplesmente belos... :)
Olá!
Ela não teve que fazer escolha. Ficou com ambos. E ambos tinham interiores, positivamente, férteis.
Parabéns.
Para mim tem um sabor especial estes ingénuos e sentidos poemas pois nasci em 02.02.52 bem perto da data que foram feitos. Eu ainda no útero de minha mãe e você já a sentir a necessidade de uma sociedade mais livre e do amor sempre.
Bjs
TD
António!
depois passo para ler mais atentamente, porque gostei do que li, mas agora tenho no - eu estou aki .- um desafio para ti!Vai lá ver!
beijinhos!
Pois é, meu caro Poeta, eu também ficava com os dois sonetos...
Hoje, creio que escolherias o segundo... "Dia há-de vir" porque afinal, está tão actual... ora vê...
"Mas não, Amor, que o tempo é de labuta
O DIA não vai vir sem ser com luta
E a luta, temos nós de a travar!"
... não continua a LUTA? Não deve continuar?
Tão actual ainda...
Beijo ;)
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