1.31.2006

AMOR E FUTEBOL


Ela, chama-se Filipa: Ele, Diogo. Não é que os nomes tenham qualquer importância para a história. Menciono-os apenas para que constem.
Ela, é loura, de olhos azuis, boca bem desenhada, lábios carnudos, busto firme sem ser demasiado grande, cintura fina, pernas longas e bem torneadas, formas sinuosas, enfim um pedaço de mau caminho.

Ele, é enorme, bem talhado, rosto largo, moreno, boca longa, sorriso simpático, ginasticado, musculoso, do género de pôr a cabeça à roda a qualquer mulher.
Conheceram-se no Parque da Nações assistindo no ecrã gigante ao jogo inaugural do Euro/2004 e de imediato se apaixonaram.

Voltaram a encontrar-se mais vezes no mesmo local, assistindo juntos a todos os jogos em que participou a selecção nacional, tão cheio o coração de ardor patriótico pelas proezas dos nossos rapazes como do erotismo que dos seus corpos se desprendia.
Ainda o campeonato não tinha acabado e já a chama que os incendiava os levara à cama de um motel das redondezas. Faziam um par certo em jogos de cama. Encaixavam na perfeição. Ela mostrava-se insaciável e ele nunca se furtava às exigências da sua fogosidade de mulher jovem e saudável.

Casaram no verão seguinte. Ela, é licenciada em Direito e trabalha como estagiária numa importante firma de advogados, Ele, é professor de Educação Física e técnico de um grande clube de futebol.
O seu casamento foi, pois, um evento bastante badalado, com centenas de convidados. Tudo gente famosa. Quer do meio da advocacia quer do desporto.

A sua vida social e profissional vai agora de vento em popa, como usa dizer-se e no que diz respeito à vida amorosa, cada noite é, ainda, como se fosse a primeira noite. As mesmas carícias, as mesmas performances as mesmas ternas palavras “meu torrãozinho de Alicante!”, que ele lhe cicia aos ouvidos na hora da verdade.

Ontem, porém, algo funcionou mal na sua habitualmente escaldante sessão amorosa. Diogo não estava talvez nos seus dias e Filipa, por seu lado, preocupada com qualquer problema de um processo mais complicado no Escritório, também não ajudou muito. Foi um fiasco. Enervaram-se os dois e, por muito que tentassem, a consumação do acto tornou-se de todo impossível.

Hoje, no seu gabinete, Filipa não consegue concentrar-se. Tudo lhe corre mal. Culpa-se de tudo o que aconteceu. Acha que não foi suficientemente terna, que não foi suficientemente sedutora e toma uma decisão. Ele hoje vai estar todo o dia em casa a preparar um trabalho de especialização no âmbito da sua licenciatura. E Filipa pensa. Falo com o chefe, digo que preciso de sair para recolher elementos referentes ao processo que tenho em mãos e vou fazer uma surpresa ao Diogo. O amor, assim, fora do horário normal, sabe sempre melhor e vai ser uma tarde de sonho.

Assim, logo a seguir ao almoço, fechou o gabinete, despediu-se do chefe, passou por uma loja de lingerie na baixa, onde comprou umas calcinhas e uma combinação de um estilo particularmente sexy, de um vermelho quente como ele gosta, meteu-se no carro e aí vai ela, rumo à Lapa, onde se situa a sua residência e ninho de amor.

A viagem é feita em autêntico devaneio, antegozando as cenas que sabe que vão acontecer à chegada. Vê-se nos braços dele, sente-lhe as mãos enormes a acariciá-la, a despir-lhe as calcinhas vermelhas e estremece com as cócegas das sua boca a murmurar-lhe ao ouvidos as costumadas palavras “meu torrãozinho de alicante!”. Sente o coração bater mais forte, um calor a incendiar-lhe as zonas erógenas, vivendo por antecipação as cenas deliciosas dos próximos momentos.

Arruma o carro na garagem. Toma o elevador até ao 2º piso, que é o seu, mete a chave devagarinho para não fazer ruído e a surpresa resultar inteiramente. Diogo não está na sala. Deve estar a repousar, coitado, talvez a dormir uma soneca. Descalça-se e dirige-se para o quarto pé ante pé. Quando se preparava para rodar a maçaneta da porta, ouve lá dentro um arfar ruidoso e a voz do seu Diogo, no tom inconfundível do momento de um orgasmo: “sim, sim, meu amor, meu torraozinho de Alicante!!!!!”Filipa abre a porta de rompante e, deitados na cama, em pelota e apenas com peúgas da cor do clube vê, enroscados, o seu Diogo e o respectivo assistente técnico do clube de que ele é o Técnico principal.
* * *
Pois é, afinal o rapaz gosta mesmo é de torrão de Alicante.

2 Comments:

Blogger MEHC said...

António: Mas que narrador de talento me saiu!!A história tem um desfecho ...nem direi inesperado...mas certamente muito curioso. Conheço uma idêntica, o que me faz supor que não são raras, nos dias de hoje...

07 janeiro, 2007 23:03  
Blogger Codinome Beija-Flor said...

Antonio!!
Que triste, que medo.
Acho que é a maior humilhação que pode uma mulher sofrer.
mas sua narrativa é maravilhosa.
Cada dia mais tenho medo das surpresas da vida.
Abraços

31 janeiro, 2007 03:22  

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